domingo, 30 de agosto de 2015

DECLARAÇÃO DE PARIS PARA A FILOSOFIA 1995

Extraído de: "Filosofia e Democracia no Mundo" Paris, 15 e 16 de fevereiro de 1995


"Nós, participantes das jornadas internacionais de estudo 'Filosofia e democracia no mundo', organizadas pela UNESCO, que ocorreram em Paris, nos dias 15 e 16 de fevereiro de 1995,

"Constatamos que os problemas de que trata a filosofia säo os da vida e da existência dos homens considerados universalmente,

"Estimamos que a reflexäo filosófica pode e deve contribuir para a compreensäo e conduta dos afazeres humanos,

"Consideramos que a atividade filosófica, que näo subtrai nenhuma idéia à livre discussäo, que se esforça em precisar as definiçöes exatas das noçöes utilizadas, em verificar a validade dos raciocínios, em examinar com atençäo os argumentos dos outros, permite a cada um aprender a pensar por si mesmo,

"Sublinhamos que o ensino de filosofia favorece a abertura do espírito, a responsabilidade cívica, a compreensäo e a tolerância entre os indivíduos e entre os grupos,

"Reafirmamos que a educaçäo filosófica, formando espíritos livres e reflexivos - capazes de resistir às diversas formas de propaganda, de fanatismo, de exclusäo e de intolerância - contribui para a paz e prepara cada um a assumir suas responsabilidades face às grandes interrogaçöes contemporâneas, notadamente no domínio da ética,

"Julgamos que o desenvolvimento da reflexäo filosófica, no ensino e na vida cultural, contribui de maneira importante para a formaçäo de cidadäos, no exercício de sua capacidade de julgamento, elemento fundamental de toda democracia.

"É por isso que, engajando-nos em fazer tudo o que esteja em nosso poder - nas nossas instituições e em nossos respectivos países para realizar tais objetivos, declaramos que:

"Uma atividade filosófica livre deve ser garantida por toda parte - sob todas as formas e em todos os lugares onde ela possa se exercer - a todos os indivíduos;

"O ensino de filosofia deve ser preservado ou estendido onde já existe, criado onde ainda näo exista, e denominado explicitamente 'filosofia';

"O ensino de filosofia deve ser assegurado por professores competentes, especialmente formados para esse fim, e näo pode estar subordinado a nenhum imperativo econômico, técnico, religioso, político ou ideológico;

"Permanecendo totalmente autônomo, o ensino de filosofia deve ser, em toda parte onde isto é possível , efetivamente associado - e näo simplesmente justaposto - às formaçöes universitárias ou profissionais, em todos os domínios;

"A difusäo de livros acessíveis a um largo público, tanto por sua linguagem quanto por seu preço de venda, a geraçäo de emissöes de rádio ou de televisäo, de audiocassetes ou videocassetes, a utilizaçäo pedagógica de todos os meios audiovisuais e informáticos, a criaçäo de múltiplos espaços de debates livres, e todas as iniciativas susceptíveis de fazer aceder um maior número a uma primeira compreensäo das questöes e dos métodos filosóficos devem ser encorajadas, a fim de constituir uma educaçäo filosófica de adultos;

"O conhecimento das reflexöes filosóficas das diferentes culturas, a comparaçäo de seus aportes respectivos e a análise daquilo que os aproxima e daquilo que os opöe, devem ser perseguidos e sustentados pelas instituiçöes de pesquisa e de ensino;

"A atividade filosófica, como prática livre da reflexäo, näo pode considerar alguma verdade como definitivamente alcançada, e incita a respeitar as convicçöes de cada um; mas ela näo deve, em nenhum caso, sob pena de negar-se a si mesma, aceitar doutrinas que neguem a liberdade de outrem, injuriando a dignidade humana e engendrando a barbárie.

"Esta declaraçäo foi subscrita por:

- Prof. Ruben G. Apressian (Instituto de Filosofia da Academia de Ciências de Moscou, Federaçäo Russa),

- Prof. Tanella Boni-Koné (Universidade de Abidjan, Costa do Marfim),

- Prof. Tzotcho Boyadjiev (Universidade Saint Klément Ohridski, Sófia, Bulgária),

- Prof. In-Suk Cha (Secretário Geral da Comissäo Nacional para a UNESCO da República da Coréia, Seul, República da Coréia ),

- Prof. Marilena Chaui (Universidade de Säo Paulo, Brasil),

- Prof. Donald Davidson (Universidade de Berkeley, USA),

- Prof. Souleymane Bachir Diagne (Universidade de Dakar, Senegal ),

- Prof. François Dossou (Universidade Nacional do Benin, Cotonou, Benin),

- Prof. Michaël Dummett (Oxford, Reino Unido),

- Prof. Artan Fuga (Universidade de Tirana, Albânia),

- Prof. Humberto Gianini (Universidade de San Tiago do Chile, Chile),

-Prof. Paulin J. Houtondji (Universidade Nacional do Benin, Benin),

- Prof. Joanna Kuçuradi (Secretária Geral da Federaçäo Internacional das -Sociedades de Filosofia, Ancara, Turquia),

- Prof. Dominique Lecourt (Universidade de Paris VII, Paris, França),

- Prof. Nelly Motroshilova (Universidade de Moscou, Federaçäo da Rússia),

- Prof. Satchidananda Murty (Vice-Presidente da Federaçäo Internacional das Sociedades de Filosofia, Índia),

- Prof. Ulrich Johannes Schneider (Universidade de Leipzig, Alemanha),

- Prof. Peter Serracino Inglott (Reitor da Universidade de Malta), S. E. Mohammed Allal Sinaceur (Antigo Diretor da Divisäo de Filosofia da UNESCO, Rabat, Marrocos),

- Prof. Richard Susterman (Temple University, Filadélfia, USA),

- Prof. Fathi Triki ( Decano da Faculdade de Letras e Ciências Humanas de Sfax, Tunísia),

- Prof. Susana Villavicencio (Universidade de Buenos Aires, Argentina)."

Extraído de : UNESCO. Philosophie et Démocratie dans le Monde

- Une enquête de l'UNESCO. Librairie Génerale Française,
1995, p. 13-14

sábado, 29 de agosto de 2015

ESTÃO SE ACABANDO RECURSOS NA DISPENSA DA CASA COMUM

''E assim gaiamente vamos ao encontro de um abismo que se abre logo aí à nossa frente.''


A Terra é um planeta pequeno, velho, com a idade de 4,44 bihões de anos, com 6.400 km de raio e 40.000 km de circunferência. Há 3,8 bilhões de anos surgiu nele todo tipo de vida e há cerca 7 milhões, um ser consciente e inteligente, altamente ativo e ameaçador: o ser humano. O preocupante é o fato de que a Terra já não possui reservas suficientes em sua dispensa para fornecer alimentos e água para seus habitantes. Sua biocapacidade está se enfraquecendo dia a dia.

O dia 13 de agosto foi o Dia da Sobrecarga da Terra (Earth Overshooting Day). É o que nos informou a Rede da Pegada Global (Global Footprint Network) que, junto com outras instituições como a WWF e oLiving Planet acompanham sistematicamente o estado da Terra. A pegada ecológica humana (quanto de bens e serviços precisamos para viver) foi ultrapassada. As reservas da Terra se estão se esgotando e precisamos de 1,6 planeta para atender nossas necessidades sem ainda aquelas da grande comunidade de vida (fauna, flora, micro-organismos). Em palavras de nosso cotidiano: nosso cartão de crédito entrou no vermelho.

Até 1961 precisávamos apenas de 63% da Terra para atender as nossas demandas. Com o aumento da população e do consumo já em 1975 necessitávamos 97% da Terra. Em 1980 exigíamos 100,6%, a primeira Sobrecarga da pegada ecológica planetária. Em 2005 já atingíamos a cifra de 1,4 planeta. E atualmente em agosto de 2015 1,6 planeta.

Se hipoteticamente quiséssemos, dizem-nos biólogos e cosmólogos, universalizar o tipo de consumo que os países opulentos desfrutam, seriam necessários 5 planetas iguais ao atual, o que é absolutamente impossível além de irracional(cf. R. Barbault, Ecologia geral, 2011, p.418).

Para completar a análise cumpre referir a pesquisa feita por 18 cientistas sobre “Os limites planetários: um guia para o desenvolvimento humano num planeta em mutação” publicada na prestigiosa revistaScience de janeiro de 2015 (bom resumo em IHU de 09/02/2015). Aí se elencam 9 fronteiras que não podem ser violadas, caso contrário, colocamos sob risco as bases da vida no planeta (mudanças climáticas; extinção de espécies; diminuição da camada de ozônio; acidificação dos oceanos; erosão dos ciclos de fósforo e nitrogênio; abusos no uso da terra como desmatamentos; escassez de água doce; concentração de partículas microscópicas na atmosfera que afetam o clima e os organismos vivos; introdução de novos elementos radioativos, nanomateriais, micro-plásticos).

Quatro das 9 fronteiras foram ultrapassads mas duas delas – a mudança climática e a extinção das espécies – que são fronteiras fundamentais, podem levar a civilização a um colapso. Foi o que concluiram os 18 cientistas.

Tal dado coloca em xeque o modelo vigente de análise da economia da sociedade mundial e nacional, medida pelo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). Este implica uma profunda intervenção nos ritmos da natureza e a exploração dos bens e serviços dos ecosistemas em vista da acumulação e com isso do aumento do PIB. Este modelo é uma falácia pois não considera o tremendo estresse a que submete todos os serviços ecossistêmicos globais que garantem a continuidade da vida e de nossa civilização. De forma irresponsável e irracional considera tal fato, com suas graves consequências, como “externalidades”, vale dizer, fatores que não entram na contabilidade nacional e internacional das empresas.

E assim gaiamente vamos ao encontro de um abismo que se abre logo aí à nossa frente. Curiosamente, nas discussões sobre temas econômicos que se organizam semanalmente nas TVs ( por exemplo, o Painel da Globoniews, aos sábados e domingos) nunca ou quase nunca se faz referência aos limites ecosistêmicos da Terra. Com raras exceções, os economistas parecem cegos e cegados pelas cifras do PIB, reféns de um paradigma velho e reducionista de analisar a economia concreta que temos. Se todas as fronteiras forem violadas, como tudo parece indicar, que acontecerá com a Terra viva e a Humanidade? Temos que mudar nossos hábitos de consumo, as formas de produção e de distribuição como não se cansa de repisar o Papa Francisco e ausente nos analistas de O Globo que sequer fazem uma referência a um tema tão fundamental. Mal imaginam que podemos conhecer um “armagedom” ecológico-social sem precedentes.

Imaginemos o planeta Terra como uma avião de carreira. Possui limites de alimentos, de água e de combustível. 1% viaja na primeira classe; 5% na executiva e os 95% na classe econômica ou junto às baguagens num frio aterrador. Chega um momento em que todos os recursos se esgotam. O avião fatalmente se precipita, vitimando todos e de todas classes.

Queremos este destino para a nossa única Casa Comum e para nós mesmos? Não temos alternativa: ou mudamos nossos hábitos ou lentamente definharemos como os habitantes da ilha de Páscoa até restarem apenas alguns representantes, talvez invejando quem morreu antes. Efetivamente, não fomos chamados à existência para conhecermos um fim tão trágico. Seguramente “o Senhor, soberano amante da vida”(Sab 11,26) não o permitirá. Não será por um milagre mas pela nossa mudança de hábitos e pela cooperação de todos.

Leonardo Boff escreveu Proteger a Terra-cuidar da vida: como escapar do fim do mundo, Record, Rio

sexta-feira, 28 de agosto de 2015

DESCULPAS ESFARRAPADAS PARA NÃO ESTUDAR

Veja como se livrar das desculpas esfarrapadas mais comuns para não estudar.

Você vestibulando é do tipo que arranja todo tipo de desculpa para não estudar? Se a resposta é sim, este texto é para você.
Nada de fugir dos exercícios, das leituras e das revisões, segundo Wander Azanha, coordenador do cursinho pré-vestibular Oficina do Estudante. E nada de desânimo!
"Sei que não é fácil, não tem vaga para todo mundo, mas é possível", afirma Azanha, que na época da preparação para o seu próprio vestibular dividia o tempo entre estudos e trabalho.
Para a professora Augusta Aparecida Barbosa, que leciona há 30 anos e atualmente trabalha no Cursinho do XI, alguns estudantes usam desculpas (algumas bem esfarrapadas), pois não reconhecem a importância de se entrar em uma boa universidade.
"Tenho visto muitos alunos desistirem de tentar passar nos cursos mais fortes, pois eles sabem que hoje está muito fácil entrar numa particular [em cursos fracos]. E, às vezes, nem precisa pagar tão caro [as mensalidades] para estudar. Eles se desanimam", opina.
Para tentar ajudar, o UOL listou as desculpas esfarrapadas mais comuns -- com dicas para driblar cada uma delas.

► Desculpas esfarrapadas mais comuns


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Não tenho tempo

Procure aproveitar TODOS os intervalos de tempo possíveis. Que tal alguns minutinhos durante o horário do almoço ou na volta para casa dentro do ônibus? Reveja seus horários e faça um cronograma de estudos. A palavra de ordem é disciplina! #Ficaadica.
Reprodução/Tribuna 
do Ceará
Reprodução/Tribuna do Ceará

Vou acessar meu Facebook só mais uma vez

Ficar no Facebook ou nas outras redes sociais é divertido, claro! Mas é preciso manter o foco principal: estudar para passar no vestibular. Por isso, desligue tudo. Aproveite essa reta final para dar um último gás. Depois das provas você poderá voltar a navegar tranquilamente pela internet ;-).
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Nunca fui um bom aluno

Sempre é tempo de recuperar o estudo perdido. A bagagem é importante, mas não é um fator limitante. "Já tive casos de alunos que eram muito ruins, mas que conseguiram passar em medicina depois do estudar. Com disciplina eles se tornaram alunos brilhantes", relembra Azanha.
Facebook PreVestDáDeprê
Facebook PreVestDáDeprê

Tenho dificuldades para me concentrar

Mantenha tudo que possa atrapalhar desligado. Celular, televisão... tudo! Ter um bom local de estudo e fazer pausas a cada 1h também podem ajudar na concentração. "Não vai acontecer nada de muito relevante na face da terra em 2h que você não possa desligar", brinca Azanha.
Reinaldo Canato/UOL
Reinaldo Canato/UOL

Vou fazer apenas como um teste

Não use o vestibular apenas como teste. Para isso, existem os simulados e as provas anteriores. Treinando, o vestibulando ganha familiaridade com as provas e acaba acostumando seu corpo para a maratona de exercícios. Além do mais, isso não é desculpa para evitar os estudos.
Reprodução/Flickr/
Champpugsly
Reprodução/Flickr/Champpugsly

Tenho muitos compromissos

Os compromissos com a balada, com os aniversários, com o cuidado do cachorro são coisas que devem ser balanceadas com os estudos. Por mais que o vestibulando tenha tudo isso para fazer, ele precisa separar um tempo para as obrigações. É preciso ter atitude e disciplina.
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Já tentei algumas vezes e não passei

Acredite que é possível. "Olhe para trás e verifique o que não deu certo. [Não passar no vestibular] Deve ser um trampolim para uma coisa melhor. Errou a estratégia? Errou a disciplina? Verifique o que pode funcionar", afirma o professor Azanha.
Rodrigo Capote/Folhapress
Rodrigo Capote/Folhapress

Não tenho dinheiro para pagar o cursinho

É complicado, mas a internet pode ajudar. Existem provas, simulados e aulas inteiras gratuitas. Aqui mesmo no UOL existe uma seção exclusiva para os vestibulandos onde você pode acessar roteiro de estudos, resumo de disciplinas, atualidades e ainda fazer simulados ;-).
Fernando Moraes/Folhapress
Fernando Moraes/Folhapress

Fiz escola pública. Não tenho chances

Não desista antes de tentar. Você terá que se esforçar muito? Provavelmente. Mas há chances, sim! "Eu sou prova viva. É possível. Existem alunos da escola pública que são excelentes. Você tem que querer", ressalta o professor Azanha.
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Me sinto velho demais para o vestibular

Nunca é tarde para estudar e nem arriscar coisas novas. Acredite em você e no seu potencial. Você é capaz! "Onde está escrito que se tem que entrar na faculdade com 18 anos? Não tem lei. Tem aluno que entra com 17 e é frustrado", destaca Azanha.
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Ainda não sei o curso que quero prestar

A primeira grande prova é o Enem e para ele não é preciso decidir o curso antecipadamente. Respire fundo e tenha calma. Continue com a rotina de estudos, tenha disciplina e pesquise assim que possível o curso (ou os cursos) que mais gosta para ajudar na decisão.
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Não dá mais tempo de estudar

Os vestibulares estão chegando, mas dá tempo! Priorize a resolução das provas anteriores dos vestibulares. Assim, você consegue identificar as matérias que mais caem, rever as questões em que teve mais dificuldade e ainda se acostuma com a estrutura e com o tempo das provas.



sexta-feira, 21 de agosto de 2015

É PRECISO REPENSAR A FORMAÇÃO DOS PROFESSORES

Bernardete Gatti, pedagoga e pesquisadora, diz que é preciso repensarmos - com consequências práticas - a formação dos professores.

Bernardete Gatti: pela valorização do estágio
e da prática em sala de aula
Melhorias efetivas na área da educação só serão possíveis se repensarmos - com consequências práticas - a formação dos professores nos cursos superiores. O alerta é da pedagoga e pesquisadora Bernardete Gatti, vice-presidente da Fundação Carlos Chagas, que concedeu extensa entrevista à publicação Cadernos Cenpec, em que detalha as causas e as consequências de a prática docente ser sempre relegada a um plano em que é considerada "algo menor".

O problema ocorre tanto nas licenciaturas quanto nos cursos de pedagogia. No primeiro caso, as disciplinas de educação costumam aparecer apenas "como adendo" aos bacharelados. "Você segmenta, valoriza o conhecimento formal da disciplina da área e dá uma tintura leve de educação, que não é suficiente, hoje, para o professor atuar com as crianças, os adolescentes e os jovens", avalia Bernardete.

Os cursos de pedagogia, por sua vez, vivem uma ambiguidade: formar pedagogos ou professores? A formação de alfabetizadores e de professores para a educação infantil acaba sempre relegada a segundo plano. "Parece que gostamos de considerar o trabalho de um ponto de vista apenas teórico, achamos que a prática do trabalho é menor e que pode ser feita de qualquer jeito."

O próprio funcionamento da universidade contribui para esse cenário, com currículos fragmentados, aulas que não inovam e um sistema de contratação de professores que pouco considera sua formação didática. "Como um professor que não tem formação pedagógico-didática vai formar professores?", questiona Bernardete. "Muitos vão trabalhar com metodologia e prática de ensino sem o domínio teórico que essas áreas exigem."

Iniciativas que buscam conceber novas propostas existem, mas sua expansão muitas vezes esbarra na burocracia, na acomodação e na descontinuidade da gestão. Um dos aspectos centrais, aponta a pesquisadora, é valorizar e reestruturar os estágios. Para ela, o ideal seria que universidades e escolas estabelecessem convênios, com um projeto de trabalho em conjunto. Outra proposta é a criação de centros de formação de professores nas universidades, com o objetivo de permitir e incentivar uma articulação entre os docentes das diversas áreas da instituição.

Para ler a entrevista na íntegra, acesse http://cadernos.cenpec.org.br/cadernos/index.php/cadernos/article/view/297/283

LEITURA E ESCRITA NA PRÉ-ESCOLA


Aos 4 e 5 anos, os pequenos estão cercados por textos e têm muitas ideias sobre a língua escrita. Conheça seis condições didáticas para fazê-los avançar.


Na rotina da pré-escola, as crianças escrevem e se divertem 
com as letras móveis.
Mensagens, palavras, frases, textos. Compreender e ser compreendido por meio da escrita. Eis a magia do ler e escrever. Porém, a melhor época para se iniciar no mundo das letras tem sido um tabu ao longo dos anos. Na escola pública, defende-se que essa prática é séria demais para a Educação Infantil, muito escolar para os pequenos que merecem exercer seu direito de brincar. O inverso acontece nas instituições particulares, que defendem a alfabetização nessa faixa etária. Mas, entre a proibição e a obrigação, existe uma criança que explora o mundo da escrita e pensa ativamente sobre ela. As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil orientam a "articular as experiências e os saberes das crianças com os conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural". A verdade é que, desde muito novas, elas têm acesso à linguagem escrita em seu dia a dia e, aos 4 e 5 anos, estão em plena fase de investigação desse objeto da cultura, inclusive nos suportes digitais. Exploram o teclado do computador, veem o bilhete à mão preso na geladeira, reconhecem os produtos na prateleira do supermercado, os nomes dos programas na televisão e as placas de sinalização. A escrita está por toda parte. Postergar a interação com ela não é uma boa opção.

No texto O Ensino e a Aprendizagem da Alfabetização: uma Perspectiva Psicológica, de 2002, a pesquisadora argentina Ana Teberosky e a espanhola Isabel Solé esclarecem que, nos últimos 30 anos, o avanço mais significativo na área foi reconhecer que as hipóteses sobre a linguagem escrita de crianças entre 3 e 5 anos fazem parte do processo de alfabetização inicial. Essa conclusão se choca com a visão de que a pré-escola é apenas uma etapa preparatória do Ensino Fundamental, que privilegia treinamentos mecânicos como o desenho das letras, atividades de coordenação visomotora e exercícios de cópia. Essas práticas compartimentam a escrita e ignoram a qualidade da comunicação que se estabelece por meio dela. Dividir a linguagem em etapas de pré- alfabetização, alfabetização e pós-alfabetização é negar que existe um processo contínuo de aprendizagem. Para favorecer o desenvolvimento dos pequenos, vale a pena ensinar a usar as letras em situações reais de leitura e escrita, propiciar momentos de reflexão sobre elas, conversar sobre suas denominações e promover a relação com palavras e partes de palavras conhecidas, como os nomes de amigos e parentes ou os títulos de histórias.

► Para explorar os textos na pré-escola

Desse modo, cabe ao educador atuar para democratizar o acesso ao mundo da escrita, que ainda se apresenta com desigualdade para crianças de classes sociais distintas, e ser um interlocutor inteligente dessa aprendizagem, promovendo um ambiente alfabetizador. "O professor deve dar todas as condições para que a sala pense sobre como se escreve, para que se escreve e quem escreve", explica Silvana Augusto, formadora do Instituto Avisalá. As reflexões devem levar em conta as relações entre os elementos da linguagem verbal, pois é nessas relações que eles encontram significado e não em partes isoladas, como as letras. Por isso, é importante que os pequenos tenham acesso a uma diversidade de materiais escritos, ouçam a leitura de diferentes gêneros textuais, tenham oportunidade de escrever segundo suas ideias, interpretem o escrito por meio do contexto e produzam textos ditados ao docente.

Além de inseri-las nas práticas reais de linguagem, é essencial que se compreenda a forma própria que as crianças têm de construir conhecimento sobre a escrita, conforme já demonstrado em pesquisas desde o início da década de 1980. "Quando escrevem, elas colocam em jogo tudo o que conhecem, expondo suas ideias, compartilhando-as com outros escritores, como colegas e professores, e evoluindo", afirma a especialista argentina Claudia Molinari. Ou seja, somente pensar sobre o contexto não é suficiente, devem ter a chance de escrever. "Quando dizemos: escreva do seu jeito, escreva o melhor que pode, estamos dando à criança a liberdade de se expressar da forma que sabe e de acordo com as suas capacidades no momento", explica Regina Scarpa, coordenadora pedagógica da Fundação Victor Civita no texto O Conhecimento de Pré-escolares sobre a Escrita: Impactos de Propostas Didáticas Diferentes em Regiões Vulneráveis.

De acordo com Regina, que observou quatro turmas de Educação Infantil para sua tese de doutorado, existem situações didáticas que impulsionam essa aprendizagem. O trabalho com nome próprio - a primeira palavra com significado para a criança - fornece um conjunto básico de letras que cada um usará para compor outras palavras. Quando se promove a escrita, a interpretação e a revisão da própria escrita, a criança começa a estabelecer relações com o que quis dizer e o que escreveu. Na produção de texto coletivo, com o educador atuando como escriba, os pequenos pensam no que desejam comunicar e estabelecem diferenças entre o registro oral e o escrito. Além disso, a organização de sala em duplas ou subgrupos com acesso a fontes de informações favorece as trocas produtivas e amplia consideravelmente o repertório dos pequenos.

Todas essas situações devem ser elaboradas levando em conta o ponto de vista da criança pequena, para quem não há distinção entre aprender e jogar. Você verá que todos vão avançar na compreensão do sistema alfabético, sem a obrigação de chegar a uma escrita convencional.

Fonte: http://revistaescola.abril.com.br/

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

BIBLIOTECA: DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COGNITIVO DE CRIANÇAS


Estudo do Instituto Brasil Leitor aponta os pontos positivos sobre o desenvolvimento social e cognitivo de crianças com idades entre 2 e 6 anos com acesso a uma biblioteca.

O acesso a uma biblioteca que integre o ler e o brincar tem impacto positivo sobre o desenvolvimento social e cognitivo de crianças com idades entre 2 e 6 anos, aponta pesquisa do Instituto Brasil Leitor (IBL). O estudo foi realizado entre 2012 e 2014 em um Centro de Educação Infantil (CEI) e uma Escola Municipal de Educação Infantil (Emei) na cidade de São Paulo, e foi dividido em duas etapas - antes e depois da implantação do Projeto Biblioteca Primeira Infância, do próprio IBL.

O instituto já implantou 80 unidades desse tipo em escolas, hospitais e empresas do país. Além de livros, o espaço dispõe de brinquedos, bonecos e um mobiliário pensado para instigar a imaginação e a criatividade.

Na primeira etapa - antes das bibliotecas -, foram coletadas informações de 24 crianças a partir de questionários aplicados aos familiares e educadores e de observações semanais dos diálogos e interações. Na segunda etapa - após a implantação das bibliotecas -, as crianças foram observadas quanto aos mesmos aspectos comportamentais, falas e reações às atividades realizadas dentro do espaço de leitura. Depois, cada criança foi avaliada com questionários aplicados aos professores e familiares.

As análises foram feitas segundo as categorias do instrumento Child Observation Record (COR), baseado na classificação de comportamentos de acordo com categorias como relações sociais, representação criativa e comunicação e linguagem. Cada item é dividido em cinco níveis de comportamento, sendo o nível 1 o mais básico e o nível 5 o mais avançado.

Os resultados apontam um aumento significativo, após a implantação das bibliotecas, de crianças no nível 5 em todas as categorias observadas. Quanto às relações sociais, por exemplo, 100% das crianças da Emei passaram ao nível máximo após a instalação das bibliotecas - antes, eram 6%. Em linguagem e comunicação, o índice saltou de 13% para 69%. Em representação criativa, o índice passou de 6% para 70%.

domingo, 16 de agosto de 2015

O PT ou se renova ou se mediocriza de vez

''Rejuvenescer-se como águia significa ter coragem para recomeçar e estar sempre aberto a escutar, a aprender e a revisar.''

Reza um mito antigo da cultura mediterrânea que, de tempos em tempos, a águia, observando em seu corpo sinais de envelhecimento, fraqueza dos olhos penetrantes, e flacidez das garras se propunha renovar-se totalmente. Assim fazia também a fênix egípcia que aceitava morrer para voltar rejuvenescida para nova vida. Qual era a estratégia da águia? Punha-se a voar cada vez mais alto até chegar perto do sol. Então as penas se incendiavam e ela toda começava a arder. Quando chegava a este ponto extremo, ela se precipitava do céu e se lançava qual flecha nas águas frias do lago. O fogo nela se apagava.

E então ocorria a grande transformação. Através desta experiência de fogo e de água, a velha águia voltava a ter penas novas, garras afiadas, olhos penetrantes e o vigor da juventude.

Queremos aplicar este mito ao PT metido numa crise crucial que o obriga a renovar-se como a águia ou aceitar o lento envelhecimento até perder todo o vigor vital e a capacidade de renovação da sociedade, como era seu sonho primordial.

Para entender melhor esse relato e aplicá-lo ao PT precisamos revisitar o filósofo Gaston Bachelard e o psicanalista C. G. Jung que entendiam muito de mitos e de seu sentido profundo. Segundo eles, fogo e água são opostos. Mas quando unidos, se fazem poderosos símbolos de transformação.

O fogo simboliza a consciência, o vigor e a determinação de abrir caminhos novos. A água, ao contrário, representa as forças do inconsciente, as dimensões do cuidado e a capacidade de entender o sentido secreto das crises.

Passar pelo fogo e pela água significa, portanto, integrar em si os opostos: a determinação com a descoberta do sentido real das crises. Elas acontecem para purificar, limpar de todo tipo de agregado e deixar aparecer o essencial. Ninguém ao passar pelo fogo ou pela água permanece intocado. Ou sucumbe ou se transfigura, porque a água lava e o fogo purifica.

A água nos faz pensar também nas grandes enchentes como conhecemos em 2011 nas cidades serranas do Estado do Rio de Janeiro. Com sua força tudo carregaram, especialmente o que não tinha consistência e solidez. Numa única noite morreram 903 pessoas e 32 mil ficaram desabrigadas. Foi um cataclismo de ressonância mundial. É o poder invencível da água.

O fogo nos faz imaginar o cadinho ou as fornalhas que queimam e acrisolam tudo o que é ganga e que não é essencial. O ouro e a prata passam por esse processo purificador do fogo.

São notórias as crises existenciais. Ao fazermos esta travessia pela “noite escura e medonha”, como dizem os mestres espirituais, deixamos aflorar nosso eu profundo sem as ilusões do ego superficial. Então amadurecemos para aquilo que é em nós autenticamente humano e verdadeiro. Quem recebe o batismo de fogo e de água rejuvenesce como a águia do mito antigo.

Mas existem também as crises maiores, de todo um projeto e mesmo de todo um partido como o PT. Ele tem que assumir a verdade: teve muitos acertos que beneficiaram milhões que viviam na pobreza e na marginalidade. Mas também cometeu erros evitáveis: deixou-se tomar pelo “demônio” do poder como fim em si mesmo quando deve ser sempre meio. Houve vergonhosa corrupção de pessoas importantes que destruíram o sonho de toda uma multidão que acreditava e se esforçava para viver o novo factível.

Mas abstraindo das metáforas e indo diretamente ao conteúdo real: que significa concretamente para o PT rejuvenescer-se como a águia? Significa entregar à morte tudo o que de errado praticou e que impede o sonho de despertar.

O velho no PT são os hábitos e as atitudes da velha política que servia de instrumento para crescer e perpetuar-se no poder. Com isso perdeu o sentido originário do poder como meio de transformação em benefício das grandes maiorias e jamais como fim em si mesmo. Tudo isso deve ser entregue à morte para o PT poder inaugurar uma forma de relação com os verdadeiros portadores do poder que é o povo e os movimentos sociais.

Rejuvenescer-se como águia significa também desprender-se de convicções enrijecidas, de certa arrogância de representar o melhor caminho e de alimentar a pretensão de estar sempre certo. Muitos dirigentes continuam manejando conceitos ultrapassados, incapazes de oferecer respostas novas à crise que devasta os países centrais e agora nos atinge poderosamente. Rejuvenescer-se como águia significa ter coragem para recomeçar e estar sempre aberto a escutar, a aprender e a revisar.

Mas não é isso que está ocrrendo. Até hoje esperamos uma revisão sincera e o reconhecimento público de seus erros. Seus líderes imaginam que assim fazendo, dão armas aos adversários, quando mostrariam ser mais fiéis mais à verdade do que à própria imagem.

O PT que se apresentava como uma águia de alto voo, corre o risco de se transformar em galinha comum que apenas cisca o chão e faz voos rasteiros. Não é esse o destino que a história lhe quer reservar.

Por último, se o PT quiser se renovar como uma águia deve regressar ao seio do povo. Este lhe dará belos exemplos de luta, de trabalho, de inteireza ética e também duras lições. Essa imersão é salvadora e renovadora como foi para a águia o arder em fogo e o mergulhar nas águas frias. Só assim pôde se rejuvenescer. Para o PT isso não é uma metáfora mas um desafio.


Por Leonardo Boff 16 de agosto 

Fonte: https://leonardoboff.wordpress.com