quarta-feira, 30 de junho de 2010

UJS com Dilma, pra ser muito mais Brasil!

André Tokarski *

Com muito otimismo e disposição para a luta, mais de 1500 militantes da União da Juventude Socialista ocuparam entre os dias 17 e 20 de junho as dependências do Centro de Convenções de Salvador/BA, para a realização do 15º Congresso Nacional da UJS.


O Congresso é resultado de um grande processo de mobilização e debate que contagiou os quatro cantos do país. Foram mais de quatro meses de muita divulgação das nossas idéias em passeatas, plenárias, nas praças e nas ruas do Brasil.
Realizamos nesse período 27 Congressos Estaduais e mais de 300 Congressos municipais, que mobilizaram cerca de 100 mil filiados, resultando em mais de 50 mil participantes na Rede UJS.
Ousadia para inovar e para aprofundar as mudanças no Brasil. Essa foi a marca do congresso. Inovamos ao criar uma Rede Social própria, que já nasce com mais de 50 mil cadastrados e mais de dois mil perfis ativados. Uma ferramenta de organização interna e de mobilização política da juventude na importante trincheira do mundo virtual. Nosso Congresso foi transmitido ao vivo pelo sítio da UJS (www.ujs.org.br), nos principais debates e plenárias estavam conectados mais de mil pessoas, do Brasil e do mundo. Entre um debate e outro, rolava sempre um “free style” com a rapaziada do hip-hop. Com mais de 20 computadores plugados na internet a galera passava o recado do que estava rolando no Congresso para seus amigos do Orkut, do twitter e da Rede UJS. O Congresso inovou também ao realizar a 1ª Mostra Científica da UJS. Duas dezenas de trabalhos nas mais variadas áreas foram apresentados e no final foi constituído o coletivo nacional de Jovens Cientistas da UJS.

Um dos objetivos do Congresso era eleger a nova Direção Nacional da UJS. Marcamos um belo gol de placa nesse quesito: somos ao total um coletivo dirigente com 79 membros titulares e 12 suplentes, com mais de 35% de mulheres e uma média de idade de 24 anos. Participam da nova Direção representantes dos 27 estados brasileiros, jovens lideranças que atuam nas mais variadas frentes: trabalhadores, como o Thiago Santana, de Minas Gerais, que é operador de telemarketing e diretor do Sinttel-MG (Sindicato dos trabalhadores em telefonia de MG); lideranças do movimento estudantil, como Augusto Chagas, presidente da UNE e Yan Evanovich, presidente da UBES; jovens mulheres e cientistas, entre elas Elisângela Lizardo, presidente da ANPG – Associação Nacional dos Pós-graduandos- e mestranda na PUC-SP e Luisa Barbosa, doutoranda em História na UFRJ. Também joga nesse time a jovem Deputada Federal Manuela D´ávila (PCdoB-RS), que além der ser uma grande parlamentar é membro da nova Direção Nacional da UJS. Nas direções estaduais, 11 mulheres presidem nossa organização. É com essa seleção que vamos mobilizar toda a juventude para jogar no time do aprofundamento das mudanças no Brasil.

Saímos desse 15º Congresso mais conectados com a juventude, pois reunimos na UJS ao mesmo tempo diversidade e unidade. O papel fundamental que queremos cumprir é o de canalizar toda rebeldia da juventude para transformar em mobilizações amplas e politizadas, em defesa do Brasil, e do socialismo. Reunimos hoje jovens de várias frentes de atuação: meio-ambiente, LGBT, jovens trabalhadores, do movimento estudantil, hip-hop, entre outras, mas mesmo nessa diversidade de pautas e bandeiras não perdemos o ponto chave que nos unifica, que é a luta em defesa do Brasil e do socialismo. A UJS está se preparando para avançar junto como esse novo ciclo político iniciado com o Governo Lula. Está pronta para crescer ainda mais para aproveitar todas as oportunidades que esse momento oferece. O Brasil tem hoje mais de 50 milhões de jovens. É ilusão pensar um processo de mudanças sem a participação ativa da juventude e a UJS estará liderando esse processo.

A idéia-força do Congresso é de que é preciso transformar todo otimismo que toma conta do Brasil em capacidade de luta e mobilização. Nunca vivemos um período em que o Brasil tivesse tantas possibilidades de dar certo e queremos aproveitar todas elas. Nesse sentido, aprovamos como bandeiras prioritárias: a luta pela destinação de 50% do Fundo Social do Pré-Sal para a educação, o esforço para construir um grande legado esportivo para a juventude relacionado à realização da Copa do Mundo e das Olimpíadas e a construção de um sistema nacional de juventude, que passe pela aprovação de projetos que consolidam as Políticas Públicas de Juventude como políticas de Estado.

A UJS tem um grande compromisso com o Brasil e com o futuro da juventude, por isso, aprovamos por unanimidade o apoio à candidatura de Dilma Rousseff. Para que os ventos continuem a soprar na direção do aprofundamento das mudanças, levaremos aos quatro cantos do país a bandeira da eleição de Dilma para a Presidência da República. Nos oito anos de governo Lula a juventude reencontrou a esperança de viver num país que pode dar certo. Milhões de empregos foram criados, o Prouni possibilitou o acesso à universidade a milhares de jovens que já tinham abandonado esse sonho, e a realização da Copa do Mundo e das Olimpíadas no Brasil é uma conquista que pode transformar o esporte numa grande ferramenta oportunidades para a juventude.

Para nós, eleger Dilma significa renovar essa esperança na certeza de que podemos conquistar ainda mais. Vamos impedir o retrocesso e derrotar José Serra, o “Exterminador do futuro” da juventude. A UJS com seus mais de 100 mil filiados espalhados no Brasil não medirá esforços para enfrentar essa batalha e temos a convicção que seremos vitoriosos.

André Tokarski, 26 anos, é Presidente da União da Juventude Socialista e publica seus artigos também no blog http://juventudenarede.wordpress.com

* 26 anos, é Presidente da UJS e membro do Comitê Central do PCdoB. Publica seus artigos também no blog: http://juventudenarede.wordpress.com

Fonte: http://www.vermelho.org.br/coluna

Desafios e inquietações dos saberes sobre o genoma humano

Fatima Oliveira *

“O PGH ainda não afetou a saúde da maioria das pessoas”

Foi um momento solene e mágico. Era 26 de junho de 2000. O presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton, e o primeiro-ministro britânico, Tony Blair, ao lado de Francis Collins, do projeto Genoma Humano, e de John Craig Venter, da empresa privada Celera Genomics, apresentaram ao mundo algo como o Santo Graal, o código da vida: as sequências do genoma humano. O mapa do PGH não se sabe de quem é, mas o da Celera é o genoma do próprio Venter!

Acompanhei a peleja dos cientistas ao cerne da intimidade humana, nossos genes, analisando aspectos científicos, políticos, sociais, filosóficos e éticos. E escrevi um livro sobre as "coisas novas das biociências" que foi a primeira publicação de popularização da ciência escrito no Brasil sobre o tema: "Engenharia Genética: O sétimo dia da criação" (Moderna, 1995), atualizado em maio passado.

Embora genômica e proteômica tenham se desenvolvido, o marasmo pós-PGH é inquestionável. E só foi quebrado pela celeuma dos transgênicos nesta primeira década, que se firmaram na área alimentar, farmacêutica e na criação de animais bizarros. Mas o "estado da arte" continua o mesmo diante das incertezas da ciência: "Não há provas de que não fazem mal à saúde".

Ouçamos Francis Collins, atual diretor dos Institutos Nacionais de Saúde dos EUA: "A prometida revolução na saúde humana continua a ser muito real... quem esperava resultados dramáticos da noite para o dia pode sentir-se desapontado... A genômica segue a primeira lei da tecnologia: nós sempre superestimamos os efeitos de curto prazo e subestimamos os de longo". E elenca avanços pontuais dos saberes do genoma humano: "Foram desenvolvidos alguns medicamentos potentes para certos tipos de câncer; os testes genéticos podem prever se as pessoas que sofrem de câncer de mama precisam fazer quimioterapia; foram identificados os principais fatores de risco de degeneração macular (uma doença dos olhos) e se pode prever a resposta de mais de uma dezena de medicamentos". E arremata: "É justo dizer que o PGH ainda não afetou a saúde da maioria das pessoas".

John Craig Venter, agora o mago da "biologia sintética", pontua que, se o PGH custou bilhões, hoje é possível sequenciar um genoma humano em um dia, gastando poucos milhares de dólares. E declara: "Ainda há um caminho a percorrer antes que essa capacidade tenha um efeito significativo na saúde e na medicina... À medida que o custo do sequenciamento cai, a qualidade da informação precisa aumentar. A geração de dados genômicos terá pouco valor sem a informação correspondente sobre as características observáveis do indivíduo, e sem ferramentas de computação para ligar essas duas coisas", pois "os experimentos que transformarão a medicina, revelando a relação entre variação genética e resultados biológicos, como fisiologia e doenças, exigirão os genomas completos de dezenas de milhares de seres humanos, juntamente com dados digitalizados abrangentes de fenótipos".

O geneticista brasileiro Salmo Raskin, na entrevista "O genoma humano e a revolução que não veio", concedida ao "Paraná-online" em 27.4.2010, é taxativo: "Não existe um determinismo genético para tudo, ou seja, nem tudo está escrito em nossos genes"; e que, "só o fato de muito recentemente termos descoberto que ao menos metade do lixo genético é composto por sequências fundamentais na regulação do genoma, já mostra o quanto pouco sabemos sobre a genética humana, depois de anos após o anúncio do sequenciamento".
* Médica e escritora. É do Conselho Diretor da Comissão de Cidadania e Reprodução e do Conselho da Rede de Saúde das Mulheres Latino-americanas e do Caribe. Indicada ao Prêmio Nobel da paz 2005.

Fonte: http://www.vermelho.org.br/coluna

Faltam engenheiros, mas sobram caras de pau

Luciano Rezende *

"A educação é a base para o desenvolvimento. Com uma educação precária, o Brasil está se distanciando dos países do Primeiro Mundo. Como conseqüência, a economia começa a cobrar a conta em função dessa falta de estrutura".


Não há nada de errado na frase acima, com exceção da parte onde diz que estamos nos distanciando dos países do chamado primeiro mundo. Mas no geral, ela é correta. O problema é de onde ela partiu.

Em texto intitulado “Governo petista não preparou o País para o crescimento”, publicado no site do PSDB, o deputado tucano Luiz Carlos Hauly, do Paraná, teve a audácia de criticar o governo Lula pelo fato de que "só 15% dos jovens estão na universidade, o equivalente a um milhão de alunos, quando deveriam ter, no mínimo, 50% dos jovens nas universidades. Fora isso, o ensino médio não oferece cursos profissionalizantes para todos os alunos". Na visão do deputado, Lula é o responsável pelas deformidades do sistema educacional brasileiro, incapaz de formar engenheiros de qualidade para suprir a atual demanda ocasionada pelo crescimento econômico que o mesmo governo (Lula) promove.

A crítica parte justamente de um deputado filiado ao Partido (PSDB) que mais massacrou a educação brasileira. Aproveitou-se de artigo da Folha de São Paulo onde há o alerta que o “País perde US$ 15 bi com má formação de engenheiro” para alfinetar Lula. Mas essa má formação tem um histórico. O desmonte das universidades e escolas técnicas foi patrocinado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso e, apesar da grande mobilização da sociedade, não foi possível interromper as políticas neoliberais que vetaram a contratação de novos professores e servidores por oito anos, diminuíram o acesso em vários cursos, sucatearam as estruturas físicas e laboratórios, desmotivaram professores e servidores, congelaram salários e bolsas e outros crimes mais.

O Brasil se tornou, a partir do governo do PSDB, o país com o maior índice de privatização da educação na América Latina e um dos cinco em todo o mundo, se considerados o número de instituições e o percentual de matrículas. Em 1994, 22,5% das instituições de ensino superior eram públicas e 77,5% eram privadas. Em 2002, apenas 11,9% eram públicas e 88,1% privadas. Um crescimento de 118% das instituições privadas enquanto o número de instituições públicas permaneceu o mesmo.

O deputado demonstra ter uma memória fraquíssima. Pensa (ou quer fazer pensar) que é possível saltar de 15% para 50% de jovens na universidade em sete anos. É de se perguntar quanto saltou esse percentual durante os oito anos de governo FHC.

Por isso mesmo é bom comparar. Ou o deputado Hauly também é uma daqueles de que na propaganda eleitoral acha melhor olhar pra frente e esquecer (ou esconder) o passado?

De fato, a carência de engenheiros em nosso país é fato preocupante. Mais que isso, engenheiros devidamente qualificados.

Mas a herança maldita deixada por FHC só vai ser superada em médio e longo prazo. Não se gradua um engenheiro com sólida formação da noite para o dia. Esses profissionais precisam ter uma preparação adequada que comece no ensino fundamental (o mesmo nível de educação em que os governadores - do partido do deputado Hauly - foram contrários a implantação do Piso Nacional para os professores nos seus estados), diferentemente do que propôs os governos tucanos em São Paulo, por exemplo, com o regime de “aprovação automática”, para reduzir custos com o ensino e com isso formar estudantes analfabetos funcionais.

Um partido que enquanto esteve na presidência da república não criou nenhuma universidade pública ou escola técnica em oito anos, não tem moral para vir agora cobrar a formação de engenheiros qualificados. Em contrapartida, Lula e Dilma inauguraram dez novas universidades e 214 escolas técnicas, mesmo assim, muito aquém do que a economia atual, inaugurada por Lula e Dilma, necessita.

No governo passado, nem se tinha engenheiros, nem se tinha empregos. Esse era o dilema. Mas parece que disso o deputado paranaense não se lembra. Ou será isso tudo mais uma invenção da “gente que mente”? O povo saberá quem está com a razão no dia 3 de outubro.

P.S.: Um breve depoimento pessoal: como engenheiro de formação, graduado em uma universidade pública federal em plena era FHC, aproveitei só agora os concursos públicos abertos no governo Lula para ser professor federal. Na época em que me formei (1999) o desemprego era assustador e não houve nenhum concurso público durante todo esse período. Quem não se lembra disso? Meus colegas que antes eram oposição a Lula são hoje anti-PSDB declarados, assim como quase todos os reitores, diretores de escolas e a ampla maioria dos professores que puderam comparar e sentir na carne os dois governos.

* Engenheiro agrônomo, mestre em Entomologia e doutorando em Genética. Da direção estadual do PCdoB - MG

Fonte: http://www.vermelho.org.br/coluna

Aldo Rebelo: a comida vai cair do céu

Sob o autoexplicativo título Farms Here, Forests There (Fazendas Aqui, Florestas Lá), foi publicado nos Estados Unidos, em maio, estudo patrocinado pela National Farmers Union (Associação Nacional de Fazendeiros) e pela organização não-governamental Avoided Deforestation Partners (Parceiros contra o Desmatamento, em tradução livre). 


Por Aldo Rebelo, no O Estado de S.Paulo

A autora principal do relatório é Shari Friedman, ex-funcionária do governo Clinton, quando trabalhou na Environmental Protection Agency (EPA, a Agência de Proteção Ambiental), analisando políticas domésticas de mudanças climáticas e competitividade internacional. Ela também fez parte da equipe norte-americana de negociações para o Protocolo de Kyoto, que os Estados Unidos se negaram a assinar.


O tema do relatório é a perda de competitividade da agroindústria norte-americana diante dos países tropicais, principalmente o Brasil. A tese principal do estudo é que a única forma de conter essa perda de competitividade é reduzir o aumento da oferta mundial de produtos agropecuários, restringindo a expansão da área agrícola nos países tropicais pela promoção de políticas ambientais internacionais mais duras.

Segundo o relatório, "a destruição das florestas tropicais pela produção de madeira, produtos agrícolas e gado tem levado a uma dramática expansão da produção de commodities que competem diretamente com a produção americana". Desse modo, "a agricultura e as indústrias de produtos florestais dos Estados Unidos podem beneficiar-se financeiramente da conservação das florestas tropicais por meio de políticas climáticas".

O estudo avalia que "acabar com o desmatamento por meio de incentivos nos Estados Unidos e da ação internacional sobre o clima pode aumentar a renda agrícola americana de US$ 190 bilhões para US$ 270 bilhões entre 2012 e 2030". Esse aumento incluiria benefícios diretos de US$ 141 bilhões, decorrentes do aumento da produção de soja, carne, madeira e substitutos de óleo de palma, e economias indiretas de US$ 49 bilhões, em razão do menor custo da energia e de fertilizantes, pela redução das medidas compensatórias associadas à diminuição das florestas tropicais, ou seja, na medida em que os países tropicais poluírem e desmatarem menos, eles poderiam poluir e desmatar mais, sem ter de pagar por isso comprando créditos de carbono e outras medidas mitigadoras.

A candura com que eles tratam do tema é comovedora. O estudo revela que na cabeça deles não passamos mesmo de um fundo de quintal que precisa ser preservado para que eles possam destruir o resto do mundo com a consciência tranquila e, principalmente, com o bolso cheio.

Já vai longe — e sem saudades — o tempo em que a sociedade brasileira se curvava, sem questionamentos e sem esperneio, à tutela dos países ditos do Primeiro Mundo. Hoje é inadmissível pensar que países livres tenham de se submeter às manipulações econômicas de outras nações.

O aspecto trágico dessa proposta é a completa ausência de responsabilidade social dos agricultores norte-americanos, que veem a agricultura apenas como uma forma de aumentar sua própria fortuna, e não como a solução para a questão da fome no mundo. Ao produzir mais alimentos — e, com isso, mantendo seus preços mais acessíveis aos países pobres —, o Brasil ajuda a evitar que essa epidemia terrível se espalhe ainda mais no planeta.

Houve ainda uma época em que a divisão internacional do trabalho imposta pelos países ricos reservava para eles a produção de bens manufaturados e aos países pobres, o fornecimento de bens agrícolas e matérias-primas. Hoje se vai estabelecendo uma nova divisão: os Estados Unidos e a Europa transformaram-se em economias de serviço e grandes produtores e exportadores agrícolas, enquanto a produção industrial se deslocou para a Ásia.

Nesse novo esquema, países como o Brasil deveriam, na opinião deles, cumprir um novo papel: tornar-se uma espécie de "área de preservação permanente global". Com isso se resolveriam dois problemas: o comercial, pois sua produção agrícola ineficiente se viabilizaria pela redução da oferta e pelo aumento dos preços internacionais; e o ambiental, porque garantiríamos a compensação necessária para que eles continuem a manter seu atual padrão de consumo, que exige a exploração dos recursos naturais globais acima da capacidade que a natureza tem de repô-los.

Tudo isso funcionaria muito bem, não fosse o fato de sermos um país de mais de 190 milhões de habitantes, que precisam satisfazer as mesmas necessidades básicas que os americanos e europeus e têm as mesmas aspirações de progresso material e espiritual, cada vez mais parecidas e universais no mundo globalizado. Sim, nós também temos direito à felicidade nos mesmos moldes dos europeus ocidentais e dos norte-americanos!

Faz sentido, portanto, a defesa "desinteressada" que eles fazem dos chamados "povos da floresta". Além de sua expressão quantitativa reduzida, esses brasileiros têm um padrão de consumo que não compete com eles no uso dos recursos naturais e torna perfeitamente viável o esquema de "fazendas lá e florestas aqui".

Só não dizem o que fazer com os 190 milhões de nossa população que não vivem nas florestas e precisam produzir comida e outros bens para ter um padrão de vida digno. Para estes eles têm a solução que já aplicam na África, depois de arruinarem a produção local de algodão, milho, tomate e outros alimentos, com os subsídios milionários que dão aos seus próprios fazendeiros: a chamada "ajuda humanitária".

A continuar nesse ritmo, em vez de comprar comida nos supermercados, vamos acabar tendo de esperá-la cair do céu em fardos atirados pela Força Aérea Americana ou distribuídos pela Cruz Vermelha e pelo Greenpeace.

* Aldo Rebelo é deputado federal (PCdoB-SP), relator do Código Florestal, presidiu a Câmara dos Deputados e foi Ministro de Relações Institucionais no governo Lula

Fonte: http://www.vermelho.org.br/noticia

Paul Krugman: quem vai pagar a conta da terceira depressão?

Em artigo reproduzido nesta terça (29) pelo jornal O Estado de São Paul, o economista estadunidense Paul Krugman manifesta o receio de que o mundo já ingressou “nos estágios iniciais de uma terceira depressão” em função do arrocho fiscal que a Europa, agora com apoio do G20, está adotando em resposta à crise.

Krugman lembra a Grande Depressão, que veio no rastro do crahs da Bolsa de Nova York em 1929, para enfatizar que o triunfo das teses conservadoras terá um preço alto e quem vai pagar o pato são “dezenas de milhões de trabalhadores desempregados, muitos deles sujeitos a ficar sem emprego por anos e outros que nunca mais voltarão a trabalhar”.

Leia abaixo a íntegra do artigo:

A terceira depressão

Recessões são comuns; depressões são raras. Pelo que sei, houve apenas duas eras na história econômica qualificadas como “depressões” na ocasião: os anos de deflação e instabilidade que acompanharam o Pânico de 1873, e os anos de desemprego em massa, após a crise financeira de 1929-31.

Nem a Longa Depressão do século 19, nem a Grande Depressão, no século 20, registraram um declínio contínuo. Pelo contrário, ambas tiveram períodos em que a economia cresceu. Mas esses períodos de melhora jamais foram suficientes para desfazer os danos provocados pela depressão inicial e foram seguidos de recaídas.

Receio que estamos nos estágios iniciais de uma terceira depressão. Que provavelmente vai se assemelhar mais à Longa Depressão do que a uma Grande Depressão mais severa. Mas o custo – para a economia mundial e, sobretudo, para os milhões de pessoas arruinadas pela falta de emprego – será imenso.

E esta terceira depressão tem a ver, principalmente, com o fracasso político. Em todo o mundo – e, mais recentemente, no profundamente desanimador encontro do G-20, no fim de semana -, os governos se mostram obcecados com a inflação quando a verdadeira ameaça é a deflação, e insistem na necessidade de apertar o cinto, quando o problema de fato são os gastos inadequados.

Em 2008 e 2009, parecia que tínhamos aprendido com a história. Ao contrário dos seus predecessores, que elevavam as taxas de juros para enfrentar uma crise financeira, os atuais líderes do Federal Reserve e do BCE (Banco Central Europeu) cortaram os juros e partiram em apoio aos mercados de crédito. Ao contrário dos governos do passado, que tentaram equilibrar os orçamentos para fazer frente a uma economia em forte declínio, os governos hoje deixam os déficits aumentarem. E melhores políticas ajudaram o mundo a evitar o colapso total: podemos dizer que a recessão provocada pela crise financeira acabou no verão (no hemisfério norte) passado.

Mas os futuros historiadores irão nos dizer que esse não foi o fim da terceira depressão, da mesma maneira que a retomada econômica em 1933 não foi o fim da Grande Depressão. Afinal, o desemprego – especialmente o desemprego a longo prazo – continua em níveis que seriam considerados catastróficos há alguns anos e não dão sinal de queda. E tanto Estados Unidos como Europa estão próximos de cair na mesma armadilha deflacionária que atingiu o Japão.
Diante desse quadro sombrio, você poderia esperar que os legisladores tivessem entendido que não fizeram o suficiente para promover a recuperação. Mas não. Nos últimos meses observamos o ressurgimento da ortodoxia do equilíbrio orçamentário e da moeda forte.

O ressurgimento dessas teses antiquadas é mais evidente na Europa, onde as autoridades parecem estar usando os discursos de Herbert Hoover para fundamentar sua retórica, incluindo a afirmação de que elevar impostos e cortar gastos vai expandir a economia, melhorando a confiança nos negócios. Mas, em termos práticos, os EUA não estão agindo muito melhor. O Fed parece consciente dos riscos de uma deflação – mas o que propõe fazer com relação a esses riscos é, bem, nada.

O governo Obama entende os perigos de uma austeridade fiscal prematura – mas como os republicanos e democratas conservadores do Congresso não aprovam uma ajuda adicional aos governos estaduais, essa austeridade se impõe de qualquer maneira, com os cortes no orçamento estaduais e municipais.

Por que essa virada equivocada da política? Os radicais com frequência referem-se às dificuldades da Grécia e outros países na periferia da Europa para justificar seus atos. E é verdade que os investidores atacaram os governos com déficits incontroláveis. Mas não há nenhuma evidência de que uma austeridade a curto prazo, face a uma economia deprimida, vai tranquilizar os investidores. Pelo contrário: a Grécia concordou com a adoção de um plano severo de austeridade, mas viu seus riscos se ampliarem ainda mais; a Irlanda estabeleceu cortes brutais dos gastos públicos e foi tratada pelos mercados como um país com risco maior do que a Espanha, que até agora reluta em adotar medidas drásticas propugnadas pelos radicais.

É como se os mercados financeiros entendessem o que os legisladores aparentemente não compreendem: que, embora a responsabilidade fiscal a longo prazo seja importante, cortar gastos no meio de uma depressão vai aprofundar essa depressão e abrir caminho para a deflação, o que é contraproducente.

Portanto, não acho que as coisas tenham a ver de fato com a Grécia, ou com qualquer apreciação realista sobre o que priorizar, déficits ou empregos. Em vez disso, trata-se da vitória de teses conservadoras que não se baseiam numa análise racional e cujo principal dogma é que, nos tempos difíceis, é preciso impor o sofrimento para outras pessoas pra mostrar liderança.

E quem irá pagar o preço pelo triunfo dessas teses conservadoras? A resposta é: dezenas de milhões de trabalhadores desempregados, muitos deles sujeitos a ficar sem emprego por anos e outros que nunca mais voltarão a trabalhar.
Fonte: http://www.vermelho.org.br/noticia

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Aldo admite corrigir imprecisões para não facilitar desmatamento

A cada resposta, Aldo Rebelo reforça o mesmo argumento: o novo Código Florestal Brasileiro, pelo menos da forma como o deputado do PCdoB de São Paulo o concebeu, não implicará em novos desmatamentos. A concepção, porém, é diferente do resultado final presente no texto, concluído após ampla discussão. As novas regras, conforme o que está escrito no relatório de Aldo, podem ampliar o desmatamento, e o deputado já admite alterar o texto para corrigir "ambiguidades" e "distorções".

 

 Código Florestal Deputado federal há 20 anos, ex-ministro de Lula e ex-presidente da Câmara, Aldo Rebelo, 54, enfrenta a saraivada de críticas ao relatório – apontado como explicitamente favorável aos ruralistas – com uma alternância de serenidade e irritação. Explica pausadamente os pontos mais importantes, garante que analisa todas as sugestões de mudança e tenta conter o duelo raivoso entre ambientalistas e ruralistas. "As pessoas estão interpretando o relatório como interpretam Dom Casmurro, se Capitu traiu ou não traiu Bentinho, se vai ou não vai haver desmatamento."

 A seguir, confira íntegra da entrevista ao Correio Braziliense:

Correio Braziliense- O que ainda não ficou claro no relatório final, quais pontos o senhor enxerga contradições ou interpretações equivocadas?
Aldo Rebelo - A legislação florestal no Brasil foi profundamente alterada nos últimos anos. O código de 1965 só previa reserva legal numa proporção de 50% na Amazônia e 20% na Mata Atlântica. Não protegia savanas, a caatinga, o pantanal e os pampas. Com as alterações, passou a proteger os demais biomas e ampliou de 50% para 80% a reserva na Amazônia. Por outro lado, a proteção de mata ciliar começava com 5 metros e terminava com 100 metros. Houve alteração para uma proteção mínima de 30 metros e uma proteção máxima de 500 metros. As áreas de preservação permanente, a partir de uma resolução do Conama de 2002, deixaram na ilegalidade 75% da produção de arroz no país, a criação de gado no pantanal, de maçã e uva no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina, e de café em São Paulo, no Espírito Santo e em Minas Gerais. A obrigação da averbação de reserva legal na pequenas propriedades praticamente inviabilizou essas propriedades, causando êxodo rural e transferindo um problema social e ambiental do campo para a cidade. Por todas essas razões é que a legislação ambiental precisa de adaptação, para proteger o meio ambiente e também impedir o êxodo rural e a concentração da terra.

CB - O senhor constatou que realmente a necessidade de se manter áreas preservadas está por trás da expulsão dessas pessoas para as cidades?
AR - O jovem não quer mais permanecer na roça, porque a renda é muito baixa e o acesso à educação, à saúde, à cultura e à vida social é mais difícil do que na cidade. Além disso, como a legislação ambiental impõe a recomposição da área de vegetação nativa nas pequenas propriedades, a um custo que o produtor não tem condição de pagar – a recomposição de um hectare varia de 10 a 15 mil reais –, o proprietário prefere sair da área, vendê-la, trocar por um carro usado, por uma casa na periferia das cidades. Eu vi isso em todos os estados que visitei. Muitos assentados estão sem crédito porque não conseguem averbar a reserva legal. Noventa por cento das propriedades agrícolas no Brasil são familiares, é uma agricultura ainda quase pré-capitalista, semi-capitalista, sem uma renda elevada. Não é aquele agricultor que tem 200 mil hectares de soja, ou 200 cabeças de gado, e que nem mora no campo. Este é um investidor rural, que mora na cidade, é um empresário que tem terras.

CB - Quais pontos considera cruciais no relatório? O texto foi muito atacado porque, segundo os críticos, não traz o equilíbrio entre preservação ambiental e produção agropecuária.
AR - Primeiro é preciso destacar que algumas organizações não-governamentais atacaram o relatório, mas muitas entidades defenderam, como a Contag e a Força Sindical. O que é mais importante no relatório, e que a legislação atual não assegura, é uma moratória de cinco anos com qualquer tipo de desmatamento no país. Enquanto os estados não realizarem zoneamento ecológico e econômico, nós não vamos permitir a abertura de nenhuma nova área para a agricultura e para a pecuária. A legislação não protege o que resta de vegetação nativa, o que não é pouco: representa mais de 70% do território brasileiro. O compromisso de proteger esse patrimônio é um ganho muito importante do relatório. Por outro lado, o relatório procura resolver passivos, as áreas que já foram ocupadas, cuja recomposição é quase impossível. Alguns estados não têm estoque para recomposição, como é o caso de São Paulo, Rio Grande do Sul e dos estados do Nordeste.

CB - Esse é um ponto controverso, pois o relatório libera as propriedades de até quatro módulos de terem reserva legal, o que permitiria o desmatamento. Não é isso que o texto diz?
AR - O produtor não precisa averbar a reserva legal, mas o mesmo projeto proíbe o desmatamento, o que vale para o pequeno e para o grande proprietário.

CB - Mas isso somente no período da moratória?
AR - Não somente nesse período. Eu disse ao Ministério do Meio Ambiente que, se houver qualquer dúvida quanto a isso, que façam uma emenda e eu acolho. Nem o pequeno nem o grande estarão autorizados a se desfazer de nenhuma área de vegetação nativa.

CB - O senhor concorda que ficou uma dúvida em relação a isso? Esse é um ponto passível de mudança, para que fique mais claro na legislação?
O que deve ficar claro no relatório é que ninguém está autorizado a se desfazer de nenhum fragmento de vegetação nativa em suas propriedades. Pode ser feito até mesmo um cadastramento da mata que exista por lá, e o proprietário se compromete a preservar.

CB - Haverá uma modificação do texto nesse sentido?
AR - Se for para ficar mais claro, não tenho dúvida nenhuma. Os consultores que redigiram, com preocupação deles e minha, acham que não há problema de falta de clareza. Mas tanto eles quanto eu estamos dispostos a deixar mais claro, talvez acrescentando uma expressão que nós examinamos: "exclusivamente para efeito de recomposição".

CB - Um outro ponto que gerou dupla interpretação é a possibilidade de se excluir quatro módulos fiscais do cálculo da reserva legal nas grandes propriedades. O Ministério do Meio Ambiente chegou a fazer as contas sobre as perdas de vegetação em razão desse mecanismo. Também há dubiedade nesse ponto?
AR - Nas primeiras conversas, o Ministério do Meio Ambiente não tinha apresentado nenhuma proposta de alteração. Isso só me chegou ontem (quarta-feira, 23) à noite. O que houver de dúvida em relação ao compromisso do relatório com a preservação da vegetação, temos interesse em deixar claro. A clareza impedirá que amanhã alguém, com base em qualquer ambiguidade da redação, possa usar o direito de se desfazer da vegetação nativa. Vou passar o fim de semana examinando as sugestões do ministério para ver o que posso acolher, no sentido de deixar o relatório mais cristalino.

CB - Foi a própria ministra Izabella Teixeira que apresentou as sugestões?
AR - Eu falei com ela, secretários executivos e um grupo de técnicos do ministério. Deixei claro a eles que meu objetivo é trabalhar com a consolidação das áreas e correção do passivo existente.

CB - O senhor mesmo pode fazer as alterações no projeto ou é necessário que alguém provoque isso?
AR - Eu posso fazer, mas pedi que deputados e entidades enviem sugestões. O relatório não é um projeto grande, são apenas 50 artigos, e alguns deles repetem a legislação anterior. Qualquer cidadão pode enviar sugestões para eu analisar e apresentar à comissão.

CB - A votação do relatório pela comissão vem sendo sucessivamente adiada, em meio a debates acalorados entre ambientalistas e ruralistas. Há alguma razão para esses adiamentos? Foi um pedido para que o relator possa avaliar melhor o projeto?
AR - A primeira razão é essa. É preciso tempo para as pessoas lerem o relatório, receberem sugestões e examinarem. Eu não trabalho sozinho. Tenho uma equipe de consultores que organizou o relatório, além da própria comissão e de ministérios.

CB - O relatório deve ser votado ainda neste semestre?
AR - Eu defendo que sim. É um respeito à própria Câmara, que constituiu essa comissão há quase um ano. Os prazos já foram esgotados várias vezes. A resolução do Conama de 2002, por exemplo, que colocou produtores na ilegalidade, nunca foi corrigida. Por que o Ministério do Meio Ambiente não corrigiu, não fez o debate? A comissão fez essa discussão, ouviu inclusive o ministério. É preciso que se dê uma solução, não se pode deixar as pessoas na ilegalidade.

CB - O relatório que será votado na comissão especial pode ser diferente do atual?
AR - Pode, com correções das ambiguidades e maior clareza quanto à consolidação, de um lado, e à proteção efetiva, de outro. Não deve haver dúvidas quanto ao desmatamento zero nas propriedades. Muitas agressões contra o meio ambiente acontecem por ignorância. Eu nasci na roça, e nunca ouvi falar que precisava manter uma mata ciliar. As pessoas não sabiam disso, só queriam chegar perto da água para plantar macaxeira, inhame, batata. Não adianta pensar que o meio ambiente será preservado em 5.600 municípios brasileiros a partir de Brasília. A Polícia Federal faz uma operação, chega em helicóptero, prende as pessoas, e depois vai embora.

CB - Há possibilidade de revisão do tópico que inclui as áreas de preservação permanente no cálculo da reserva legal, já que se prevê um desmatamento maior com esse mecanismo?

AR - Essa previsão está completamente enganada. As pessoas estão interpretando o relatório como interpretam Dom Casmurro, se Capitu traiu ou não traiu Bentinho, se vai ou não vai haver desmatamento. Não haverá desmatamento. Ao juntar APP e reserva legal, permite-se apenas a regularização de áreas onde não há estoque de vegetação. A legislação atual já permite somar APP e reserva legal na Amazônia. O que se permitirá é o regime de servidão: o proprietário poderá alugar reserva legal para quem não tem. Se houver dúvida nesse artigo, nós vamos deixar claro que não está autorizado qualquer tipo de desmatamento.

CB - O senhor tem criticado essa briga que se instalou na comissão especial entre ambientalistas e ruralistas, e foi bem duro com as ONGs ambientais internacionais, enquanto dedica o relatório aos agricultores brasileiros. Como o senhor analisa o comportamento dos ambientalistas? E acredita que o relatório esteja sendo usado como instrumento de interesses do agronegócio?
AR - Homenagear os agricultores é homenagear uma parcela do nosso país, a quem devemos muito. Eu homenageei também os ambientalistas, dedico a eles um belo poema de Castro Alves, chamado A Queimada. Noventa por cento das ONGs merecem respeito e nós devemos a elas as denúncias de crimes ambientais no país. O que distingo são ONGs com sede no exterior e que vêm ao Brasil para defender os interesses de seus países. Eu tenho o direito de pensar dessa forma porque existe uma guerra comercial na agricultura mundial. Essas ONGs defendem os interesses dos agricultores ricos dos seus países. Não me peçam que, quando houver conflito de interesse entre o produtor de soja do Brasil e o produtor de soja dos Estados Unidos, eu fique do lado do americano. Nós devemos proteger a agricultura no que ela tem de bom e criticar o que ela tem de socialmente atrasado.

Fonte: http://www.vermelho.org.br

Condenação do Cristo marxista


Gilson Caroni *

Nas páginas do “Evangelho segundo Jesus Cristo”, a grande heresia não está no fato de o personagem pedir perdão pelos pecados de Deus. O que o Vaticano não pode perdoar é a denúncia corajosa a um cristianismo imperial e colonialista.

 

Que estranhos desígnios inspiraram o "L'Osservatore Romano" a atacar,em editorial, o escritor José Saramago, falecido recentemente na Espanha? Chamá-lo de populista extremista, que se referia "com comodidade a um Deus no qual jamais acreditou por considerar-se todo poderoso e onisciente" não revela apenas uma atitude fria e inflexível com um humanista ateu. Vai além. Reforça apreensões em relação aos objetivos políticos do Vaticano e suas consequências éticas.

Se a eleição do cardeal Ratzinger como supremo pontífice da Igreja Católica constituiu um acontecimento cuja gravidade poucos subestimaram, a superação integrista das contradições do Concílio Vaticano II já se delineava claramente no pontificado de seu antecessor, João Paulo II, quando as bases sociais da Teologia da Libertação foram firmemente atacadas.

Em 1983, ao visitar a América Central, suas homilias mantiveram fina sintonia com o projeto do governo Reagan para a região. Em Manágua, o papa não apenas não correspondeu às expectativas do povo nicaraguense de condenação clara às agressões incentivadas pelo imperialismo estadunidense, como também deu ênfase ao que mais dividia o governo sandinista e a hierarquia eclesiástica, à época: o da fidelidade dos sacerdotes e religiosas à igreja e à exigência de não participarem na responsabilidade da gestão governamental. Uma declaração de guerra aos partidários de um cristianismo progressista. Reafirmação classista de uma instituição multissecular.

Na Guatemala, um dos países em que a repressão dos governos militares fez mais vítimas entre os religiosos, João Paulo II não só visitou o presidente Ríos Montt, conhecido por ordenar massacres contra a oposição, como permitiu que o general lhe pedisse o afastamento de sacerdotes da política. Nos discursos papais não houve qualquer protesto contra fuzilamentos sistemáticos; apenas menções genéricas a Direitos Humanos. O Cristo do Vaticano, ao contrário do de Saramago, não deu ouvido a comunidades indígenas e camponesas tratadas como estrangeiras em seus próprios países.

Embora saiba muito bem que estão implícitas, na violência que se expande, a questão do poder, dos interesses econômicos nacionais e internacionais, além das considerações geopolíticas, o Jesus do "L'Osservatore" ignora que a promessa anunciada só se efetivará provocando uma transformação radical da condição social do homem. No livro de Saramago, Jesus, filho de José e amante de Madalena, vive a Paixão dos novos sujeitos. Seu sacrifício é a labuta das populações negras, o sofrimento das índias e o sangue camponês que jorra nos latifúndios.

A coexistência de um papado ultra-reacionário com governos de extrema-direita, como foi o de Bush, implica uma luta mundial de idéias que, não duvidem, será muito intensa. A crítica a uma religião de mercado, que exige o sacrifício de vidas humanas e o aniquilamento de natureza é a batalha da esquerda de nosso tempo.

Nessa guerra, ao contrário do que afirma o Vaticano, o Cristo de Saramago é aliado fundamental. Nas páginas do "Evangelho segundo Jesus Cristo", a grande heresia não está no fato de o personagem pedir perdão pelos pecados de Deus. O que o Vaticano não pode perdoar é a denúncia corajosa a um cristianismo imperial e colonialista. Um sistema de crenças que, para validar a opressão, necessita de uma metafísica negativa sobre os homens e sua história.

Saramago provocou a ira da cúpula da Igreja Católica ao reafirmar a modernidade e os valores de igualdade e liberdade. Foi isso que seu Cristo Marxista proclamou. Não de maneira idílica, mas de forma dialética, como reafirmação de vidas que devem transcender a si mesmas, eliminando práticas e relações que geram opressão e miséria.
* É professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, colunista da Carta Maior e colaborador do Jornal do Brasil

 Fonte: http://www.vermelho.org.br

sábado, 26 de junho de 2010

Ciência festeja criação da vida e Vaticano estrebucha

Carlos Pompe *

Pesquisadores anunciaram, dia 20 de maio, a criação da primeira célula controlada por um genoma sintético. Um êxito que poderá levar à produção de micro-organismos especialmente criados para desempenhar funções específicas, como secretar biocombustíveis, retirar poluentes da atmosfera ou produzir vacinas. O resultado assustou os criacionistas e sua principal organização mundial, a Igreja Católica e Apostólica Romana.

 
Cultura de células sintéticas, por microscópio eletrônico  
J. Craig Venter, que chefiou o programa privado de sequenciamento do genoma humano e liderou a atual pesquisa, anunciou: "Esta é a primeira célula sintética já feita, e nós a chamamos de sintética porque ela é totalmente derivada de um cromossomo sintético, feito com quatro garrafas de produtos químicos e um sintetizador, a partir de informação em nosso computador. Esta passa a ser uma ferramenta muito importante para tentar projetar o que queremos que a biologia faça". Nos planos dos autores está a produção de algas capazes de capturar dióxido de carbono e transformá-lo em novos combustíveis. Eles também estudam meios de acelerar a produção de vacinas.

A equipe de Venter sintetizou o genoma da bactéria M. mycoides, acrescentando a ele uma "marca d'água" para distingui-lo da versão natural. A marca d'água inclui os nomes de coautores e colaboradores do estudo, um endereço na internet, um e-mail e três citações, incluindo uma de James Joyce e uma do físico Richard Feynman: "O que sou incapaz de construir, sou incapaz de compreender". Tudo codificado em DNA.

Como as máquinas atuais apenas conseguem montar sequências curtas de DNA, os cientistas inseriram os fragmentos em leveduras, cujas enzimas reparadores de DNA "amarraram" as sequências. Eles então transferiram as sequências de tamanho médio para a bactéria E. coli e de volta para a levedura. Depois de três rodadas de montagem, havia um genoma de mais de um milhão de bases pronto.

Os pesquisadores pretendem, agora, construir genomas originais, e não de meras cópias do que já existe na natureza. Venter reconheceu que com a tecnologia do DNA sintético poderão ser criados agentes causadores de doenças. Mas a técnica representa "um aumento linear na capacidade de fazer o mal e um aumento exponencial na capacidade de fazer o bem".

Pego com as batinas nas mãos diante de mais esta refutação da necessidade de um ser superior para criar o mundo e a vida, as autoridades do Vaticano consideraram, no órgão oficial da Igreja, L'Osservatore Romano, a célula sintética um "resultado interessante", mas destacou que "deve ter regras, como tudo o que toca o coração da vida". Ora, foi exatamente usando as regras da natureza que os cientistas chegaram ao resultado exitoso de sua experiência.

Sem argumentos para contrapor ao irrefutável, o monsenhor Rino Fisichella, considerado autoridade em bioética pelo Vaticano, tratou de mudar de assunto: “Pensamos, acima de tudo, no significado que deve ser dado à vida". Então, tá.

Numa sociedade dividida e em permanente luta de classes, a utilização da ciência pode ser feita para o avanço social ou utilizada em crimes contra a humanidade. O avanço do conhecimento atômico propiciou a invenção de inúmeras máquinas a serviço da medicina, e também possibilitou aos Estados Unidos lançarem duas bombas atômicas contra o Japão, na primeira metade do século passado.

No entanto, a cada avanço científico é reafirmado o poder do conhecimento humano e o obsoletismo das crendices que obstaculizam o domínio sobre a natureza e que são utilizadas para manter as massas dóceis e submissas aos seus opressores. Como poetou Cecília Meireles:

Pelos caminhos do mundo
nenhum destino se perde:
há os grandes sonhos dos homens,
E a surda força dos vermes.
* Jornalista e curioso do mundo.

Fonte: http://www.vermelho.org.br/coluna