quinta-feira, 24 de abril de 2014

CONFESSO: TENHO ASCO DO LEGALISMO E ME FALTA CONFIANÇA NA JUSTIÇA!

''Nós somos uma interrogação na encruzilhada curva do futuro, entre a certeza das permanentes tragédias pré-anunciadas e a impunidade dos delinquentes de poder aquisitivo.''

Enquanto o país todo comenta, debate e sente, algo dentro de mim sangra e chora também. O caso do menino Bernardo Boldrini da cidade de Três Passos/RS justifica em grande parte o meu sentimento. O legalismo não tem compromisso com a verdade, com a essência da vida porque a verdade esta na lei. Mas qual Lei? - Aquela que se personaliza na decisão do Juiz e da Promotora diante da atitude determinante do menino ao procurar solitariamente o fórum da cidade e denunciar os maus tratos que vinha sendo submetido, fisicamente pela madrasta e afetivamente pelo pai. 

A visita do menino ao fórum não foi uma visita qualquer, uma troca de cortesias, um café da tarde ou para uma cuia de chimarrão. Aquela atitude de Bernardo era um grito de socorro, … não foi um gesto de mera cidadania, foi sim um apelo de direito ao afeto minimo e ainda tentar acreditar na possibilidade do pai vir a ser o herói da sua vida real, mesmo que isso fosse apenas por um dia. Aquela visita do garoto ao fórum, foi a visita da verdade coerente e desesperadora para uma estrutura juridica incredula, fria e enrijecida pelo legalismo que preferiu não tirar a venda dos olhos e contemplar o desespero vivido por ele e todos os seus sonhos de criança comprometidos. 

Mas não, os magistrados preferiram deixar a 'Ética da eficiência legal' sobrepor-se a 'Ética de proteção a vida', daquilo que poderia 'vir a ser', do 'a posteriori' ainda desconhecido, mas arquitetado e concomitantemente trágico. E além de não tiraram a venda dos olhos ainda colocaram uma nos olhos do menino fazendo-o acreditar que o pai mudaria. Talvez por isso, o resultado final do despacho dos entes jurídicos ao apostar numa relação familiar fálida carregue este gosto amargo do erro. Um sentimento de revolta que inevitavelmente nos acomete ante a certeza do desprezo anunciado/denunciado e dos riscos a vida ignorados, e então estas conclusões inevitáveis a que passamos ter e que nos inquietam dia e noite pois: 

… Bernardo teve a vida ceifada após denunciar o próprio pai, buscando ajuda junto aos que ele julgava que o protegeriam como agentes da justiça, como se fosse um ultimo grito de socorro, um clamor por um afeto desconhecido e insano daquele que ele esperava como herói. 

… Bernardo foi assassinado duplamente: de forma covarde e brutal como Humano por aqueles que não o aceitavam no grupo social familiar e de forma irresponsável como cidadão de direitos pelo legalismo putrefato e pragmático desse país. 

… Bernardo, morreu com o ECA-Estatuto da Criança e do Adolescente em seu quarto segundo relatos, algo raro de se ver para uma criança de onze anos e muito mais para nós adultos que pouco sabemos de nossos direitos e temos parca vontade de ler. - Ou você tem o ECA em seu quarto também? 

Mas ironicamente Ele foi vitimado também pela classe social a qual pertencia, porque o Estatuto da Criança e Adolescente como instrumento de defesa da vida e bem estar social da criança, parece ter efetividade e 'Ação Protetiva' imediatista somente quando é para tirar os filhos dos pobres. Ou para depositar em abrigos, destinar a adoção, ou ainda até casos suspeitos de entrega/venda para casais estrangeiros. Porém, quisera o destino que o garoto viesse nascer entre os que teriam maior poder aquisitivo e nesse ambientes o judiciário e seus tentáculo legais como os 'Conselhos Tutelares' ficam míopes – porque para esses órgãos a violência é coisa de pobre, de baixa renda. 

Talvez por isso esse sentimento negativo que verte de dentro da minha alma patriota, que o Brasil não tem vocação para ser uma nação das crianças felizes, mas sim, uma nação de futuro incerto para as mesmas, tanto na educação como para vida social no seu todo. 'Nós somos uma interrogação na encruzilhada curva do futuro, entre a certeza das permanentes tragédias pré-anunciadas e a impunidade dos delinquentes de poder aquisitivo.' Nós somos o país em que a ética do direito se resumiu num julgamento de espetáculo midiático no Supremo Tribunal Federal, e que mandou pra cadeia a parcela dos pares que não dividiram as fatias do bolo em pedaços iguais, mas que prefere manter uma criança ao infortúnio do lar para ser assassinada! 

CONFESSO: nada me choca mais do que qualquer ato de covardia cometido contra uma criança. REAFIRMO: que tenho pouca confiança na justiça! E CONCLUO: se a atitude da promotoria que julgará este crime brutal for o mesmo que tiveram os entes jurídicos que ouviram as reclamações de Bernardo na vara da Infância e Juventude e aparentemente acompanharam o caso percamos a esperança. Pois em pouco tempo poderemos ter os acusados por essa atrocidade livres pelas ruas de nossas cidades, como reabilitados para a vida social. São essas antecipadas certezas que nos preenchem de tristeza, desesperança e servem para nos reafirmar: que as ameaças mais letais nessa sociedade corrompida é a gente agir com Sinceridade, Honestidade e Inocência – Bernardo perdeu a vida pela vitalidade que tinha nas três, ... mas Ele vive, nós é que morremos diariamente ético-humano-socialmente!

Neuri Adilio Alves 
Filósofo, Professor Pesquisador