sábado, 11 de maio de 2013

A ARTE DE DEIXAR APRENDER

"(...) deixar aprender é deixar que o conhecimento nasça, que o conhecedor renasça a cada novo conhecimento, é deixar que cada um se reconheça no ato de aprender."

Para Martin Heidegger ensinar é mais difícil do que aprender porque ensinar significa: deixar aprender.

Uma arte refinada, que exige sensibilidade extrema para perceber as disposições de cada aluno, para detectar o grau de maturidade intelectual e emocional de cada aluno, para permitir que o aluno mesmo entre em contato com a necessidade pessoal de buscar a verdade

O professor que entende as “artimanhas” desse deixar aprender jamais pretende dominar o aluno com recompensas e muito menos com punições ou ameaças. Limita-se (rompendo todos os limites) a apresentar o que entende ser a verdade, mais com uma atitude de busca do que com grandes proclamações de já ter encontrado ou definido tudo.

Deixar aprender é transmitir o entusiasmo irresistível de quem se comprometeu radicalmente com a realidade. O mestre entusiasmado faz os alunos descobrirem, em clima de reverência (sem expulsar o bom humor), que aprender é emocionante porque tem a ver com o sentido da vida.

O professor que sabe deixar aprender dispensa a “aulística”, esta habilidade que se reduz a dar aulas picotadas de sala em sala. Vive, sim, da “holística”, essa visão da existência que nada deixa de fora. Não existe “o fora”. Todos os aspectos da realidade são conciliáveis numa visão generosa: o subjetivo e o objetivo, o interior e o exterior, a teoria e a praxis, a liberdade e a obediência, a autonomia e a heteronomia, o etc. e o etc.

Deixar o outro aprender é deixá-lo ver as realidades contrastantes que se harmonizam numa visão abrangente, numa visão filosófica da realidade. A realidade é matizada, e também precisamos deixar que ela se manifeste.

Deixar que o outro aprenda não é deixar de dar aulas. É cultivar o conhecimento integral da realidade, atitude que nada tem a ver com o conhecimento exaustivo das coisas, com a tentação epistemológica da análise avassaladora, com o domínio antecipado de categorias às quais o real deverá ajustar-se, custe o que custar.

O professor verdadeiro, na minha concepção, é aquele que entende o conhecimento como um co-nascimento, ou, para ser mais explícito, como o co-naissance do famoso trocadilho de Gabriel Marcel.

Isto é, deixar aprender é deixar que o conhecimento nasça, que o conhecedor renasça a cada novo conhecimento, é deixar que cada um se reconheça no ato de aprender.

O resto é pedagogia.

Professor Gabriel Perissé 
Doutor em Filosofia da Educação pela USP e coordenador pedagógico do Ipep (Instituto Paulista de Ensino e Pesquisa).