quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Cidadania infanto-juvenil e a dignidade humana

 

Leandro Alves *
 

Recentemente foi sancionada pelo Presidente da República a lei que proíbe a punição corporal em crianças e adolescentes. A sociedade iniciou um intenso debate acerca do tema, onde vários tipos de objeções foram levantadas, dentre elas a de que o Estado estaria interferindo na esfera privada, proibindo os pais de educar seus filhos. Entendo estar ocorrendo um equivoco neste debate, para um melhor enfrentamento desse assunto é necessário um olhar mais acurado do tema.


Nossa constituição tem como pilar do Estado de Direito a dignidade da pessoa humana. Numa sociedade desigual, esse princípio trás uma carga simbólica muito importante, porquanto aponta um rumo de inclusão social, onde o Estado deve garantir condições para que essa igualdade saia do plano formal e adquira alcance material, ou seja, saia do papel e passe para a vida dos seres humanos.

Com esse objetivo a sociedade vem se mobilizando e pressionando o parlamento para que se criem leis que visem trazer dignidade ao ser humano, sejam no plano de consumo – como o CDC -, seja no plano das relações entre homens e mulheres – como a lei Maria da Penha -, são formas que a sociedade buscou para dar condições de efetividade para o princípio da dignidade humana. É nesse sentido que a lei que proíbe punição corporal em crianças e adolescente deve ser entendida, mas não é o que ocorre. E por que será? Por que há pessoas que se opõem à proibição de que crianças e adolescentes sejam punidas fisicamente. Não gozariam eles do status de seres humanos? Seriam propriedades de seus pais?

A sociedade vem evoluindo, lentamente é verdade, mas estamos andando rumo a uma sociedade mais humana. Há pouco mais de cinquenta anos a desigualdade entre homens e mulheres era algo tolerado pela sociedade. Fruto de uma cultura machista que entendia a mulher como propriedade do marido. Rompemos com esse preconceito, não plenamente, pois ainda há diferenças entre homens e mulheres – basta que vejamos como o mercado de trabalho remunera a mão de obra masculina e a feminina.

Não é possível que seja tolerado que um pai ou uma mãe – lembro que a lei não se restringe a eles, mas também escolas, creches, etc. – espanquem seu filho com o argumento de que está educando-o. Não falo isso apenas do ponto de vista meramente teórico, pois sou pai solteiro de uma menina de 13 anos e nunca apliquei castigo físico para educá-la. Não precisamos espancar um filho para conquistar seu respeito.

Infelizmente não é novidade que existe um número gigantesco de famílias desestruturadas, onde uma conjugação de fatores como, desemprego, alcoolismos, miséria, entre outros, criam situações inadequadas para um lar. Não é por acaso que a maioria dos abusos infantis acontecem dentro de casa, enfim, a família já não é mais o porto seguro de uma criança e de um adolescente.

O Estado deve garantir condições para que crianças e adolescentes cresçam num ambiente que possibilite seu desenvolvimento sadio física e mentalmente. A cidadania infanto-juvenil deve ser vista como um elemento fundamental para a efetivação do princípio da dignidade humana e se para isso acontecer é necessária a intervenção do Estado – que seja bem vinda.

* Leandro Alves é Servidor do Poder Judiciário Gaúcho, ex-assessor Sindical, ex-assessor Parlamentar. E-mail: leandroalvesrs@hotmail.com
 
Fonte: http://www.vermelho.org.br/coluna