quinta-feira, 22 de julho de 2010


                    Promotor Natural e o Devido Processo Legal                  


Há mais de vinte anos, exatamente em 20 de maio de 1987, em artigo publicado no jornal "O Estado de São Paulo", o eminente ministro do Supremo Tribunal Federal, Sidney Sanches, em exposição feita junto à Subcomissão do Poder Judiciário e Ministério Público, textualmente afirmou que "o interesse público será melhor atendido e a Justiça melhor servida se o Ministério Público, em qualquer de suas funções em juízo, estiver a salvo de influências externas, seja no âmbito estadual, seja no federal", clamando por maior autonomia, financeira e administrativa, para que se garanta a seus membros maior segurança e isenção, em nome do interesse público e da justiça.

Da mesma forma, tornava-se necessária a outorga de garantias, idênticas às da magistratura, diante de possíveis influências, inclusive de ordem política, para que seus membros atuem em nome e na defesa da sociedade. Posteriormente, o constituinte, atendendo aos reclamos dos operadores do direito, estabeleceu, em cláusula pétrea, que "ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente" (art.5º inciso LIII, da CF). Garantiu-se, assim, ao acusado, prévio conhecimento de quem o perseguirá em juízo e quem aplicará o direito ao caso concreto.

Defensor da legalidade, cristalina qualificação do Ministério Público, causa espécie a posterior designação de Promotor de Justiça, em detrimento do intitulado Promotor Natural, vedando-se, dessa forma, a discricionária designação, afastando-se o verdadeiro titular, ferindo-se a regra pétrea, verdadeira garantia constitucional, porque, conforme doutrina o eminente jurista Jaques de Camargo Penteado, "governo algum pode interferir no Ministério Público para obter acusação contra inimigo político, sob pena de violação dos princípios da igualdade e da ampla defesa. Não basta o controle jurisdicional posterior, eis que a todo indivíduo deve ser assegurado o direito de jamais ver seu nome inserido numa denúncia sem supedâneo suficiente. E o contrário deve igualmente ser analisado. Governo algum pode interferir no Parquet para obter denúncia que jamais chegará a bom termo ou arquivamento que deixará de levar à condenação justamente aquele que feriu a ordem jurídica".

Os notáveis avanços e as novas tarefas atribuídas ao Ministério Público, ao contrário do que se pode inferir, possuem o condão de permitir a seus membros o cumprimento desses misteres, em proveito da sociedade, única beneficiada, não tendo jamais o intuito de estabelecer privilégio a determinada casta de funcionários.

A concessão de discricionariedade na designação de promotor em detrimento daquele prévia e legalmente autorizado a propor ação desvirtua e macula o devido processo legal, voltando-se a tempos pretéritos "em que o Ministério Público se notabilizou por servir ao governo e aos governantes, situação esta incompatível com sua atual destinação constitucional", conforme alerta Hugo Nigro Mazzilli, que aponta o caminho correto: "justamente para que o Ministério Público possa servir a sociedade e não aos governantes, precisa ser dotado de garantias substanciais que assegurem a independência administrativa e funcional - garantias concretas e não palavras retumbantes na Lei Maior, mas vazias de maior conteúdo prático".

A evolução da instituição, assim, caminha para o respeito às garantias estabelecidas na Constituição Federal, mas, antes de tudo, são garantias da própria coletividade e que devem, portanto, ser rigorosamente concretizadas para que não se constituam em meros enunciados. 

Claudionor Mendonça dos Santos é Promotor de Justiça e 1º Secretário do Ministério Público Democrático. 


      Fonte: http://www.correiocidadania.com.br