segunda-feira, 24 de maio de 2010

Um ganho civilizacional na luta contra o crack

O tráfico e o consumo de drogas estão entre os problemas mais sensíveis da sociedade contemporânea. E mais ainda quando se trata do crack, uma droga barata, que vicia rápido e devasta o cérebro e a saúde de seus usuários. O problema é dos grandes centros e também de muitas cidades pequenas pelo interior do país.

Os números do estrago causado pela droga são dramáticos e mostram que ela age, na sociedade, como no corpo de seus usuários: a extensão é rápida e os males causados - envolvendo principalmente a juventude - são assustadores.

Dados do Ministério da Saúde mostram a celeridade de sua evolução em apenas uma década. Considerada "droga de pobre", por ser barata, hoje 40% de seus usuários são de classe média. Há dez anos, dos dependentes químicos que procuravam tratamento em clínicas particulares, dois eram viciados em crack; hoje são nove. No atendimento do SUS a situação é parecida. Em 1999 eram 20% dos casos; hoje, são 60%. E o mal evoluiu de tal maneira que seu combate foi uma das reivindicações da marcha dos prefeitos encerrada ontem (dia 20) em Brasília.

A extensão do mal é tamanha que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva resolveu federalizar o combate contra ele, assinando ontem (dia 20) o decreto de criação do Plano Integrado para Enfrentamento do Crack, que vai envolver somente neste ano 410 milhões de reais em investimentos para tratamento, estudos e outras atividades preventivas. “Precisamos acabar com o ‘achismo’ e entender com precisão o problema do crack”, disse o presidente da República. “Vamos tentar encontrar um jeito de jogar muito duro para combater o crack em parceria com os prefeitos" e com a participação de igrejas, sindicatos e outras entidades, completou o presidente.

Há duas maneiras básicas para combater o tráfico de drogas e os males provocados por ele, que se acentuam quando se trata do crack. Uma delas é a repressão policial pura e simples. É a perspectiva tradicional. Uma política falida que atende aos anseios dos setores mais conservadores da população e tem consequências funestas e pouco eficazes, como se tem visto. Os criminosos, voltados principalmente para o tráfico de drogas (entre elas o crack), se fortalecem e rivalizam com a organização da repressão policial; as guerras de quadrilhas se sucedem, a troca de tiros com a polícia vira um pesadelo cotidiano para comunidades pobres, o sangue corre em ritmo de guerra civil, e a corrupção policial é um câncer que coloca no mesmo balaio a parte podre da polícia e os bandidos do tráfico.

A outra maneira de enfrentar o problema é tratá-lo como uma epidemia, como um caso de saúde pública. Na opção repressiva o usuário (alvo tanto dos traficantes quanto da ação policial) fica sozinho, isolado em sua miséria humana, prensado entre a barbárie do crime organizado e a violência da ação policial. Na opção adotada pelo governo federal e manifestada no plano anunciado dia 20, ele é o objetivo principal da ação sanitária e sua saúde e recuperação passam a ser o centro das atenções. Nesse sentido, o plano prevê o treinamento de profissionais da saúde pública e da assistência social para atendê-lo e também às suas famílias e tem como objetivo seu retorno ao convívio social.

O governo escolheu a civilização para combater esse mal e deixou a barbárie de lado, anunciando uma política que a pré-candidata Dilma Rousseff já adotou, como tem demonstrado em suas manifestações recentes. Além do usuário, outro beneficiado por uma política que considere o consumo de crack como um problema de saúde pública é a sociedade brasileira. Ela ganha com a perspectiva de diminuição da violência endêmica de nossas cidades, de fim das chacinas que já se tornaram rotineiras, com o aumento da paz social. E este é um ganho civilizacional.

Fonte: http://www.vermelho.org.br/editorial